Reencontro

 

O céu sobre o centro da cidade estava de um cinza vívido, como se ameaçasse chover sem querer. Miguel caminhava com a mente ainda presa à reunião que acabara de ter. O cliente parecia satisfeito, mas ele ainda repassava mentalmente os pontos discutidos. Vestia uma camisa preta de linho, uma calça jeans escura e o inseparável par de fones, um deles pendendo no pescoço. Carregava a pasta com os esboços de identidade visual do novo site que estava desenvolvendo.

Dobrou a esquina da Rua Vinte de Setembro apressado, desviando de uma senhora que descia do ônibus, e foi ali, entre o passo rápido e o zigue-zague habitual do centro, que esbarrou levemente em alguém.

— Perdão! — disse automaticamente, olhando para frente.

— Miguel?

Ele parou. A voz... ele conhecia aquela voz.

Virou-se, o coração batendo um pouco mais rápido, e seus olhos encontraram os dela. Bia.

Ela sorria, surpresa, os cabelos mais curtos agora, com ondas leves moldando o rosto e sua cor bronze brilhava com a pequena nesga de raios de sol que tocavam sua pele. Vestia um vestido longo de algodão cru, estampado com folhagens abstratas, e carregava uma bolsa transversal de tecido bordado. Havia algo nela que permanecia exatamente igual — talvez o brilho nos olhos ou o modo como a boca se curvava ao sorrir.

— Bia? — ele confirmou, quase sem acreditar.

— Sim! — ela riu — Nossa, quanto tempo! Nem acredito! Como você tá?

— Tô... bem! Quer dizer, surpreso. Caramba, há muito tempo?

— Uns 8 meses? Um ano? — ela disse, e ambos sabiam que haviam contado mentalmente — Que sorte a gente se esbarrar assim.

Ele sorriu, meio bobo.

— Tô indo pra uma exposição agora no Garibaldi. É de jovens artistas da cidade, amigos meus vão expor umas instalações bem interessantes... você tem tempo?

Miguel hesitou por um segundo, mas sentiu o estômago aquecer. O dia já tinha entregado o que precisava. Agora, aquilo parecia um presente.

— Tenho, sim. Me guia.


O Centro Cultural Garibaldi exalava aquele cheiro de madeira antiga e café forte do saguão. As paredes da sala expositiva estavam adornadas com quadros que mesclavam tinta, tecido e colagens. Instalações interativas ocupavam os cantos, com luzes e projeções que dançavam discretamente no ambiente escuro.

Miguel caminhava ao lado de Bia. Eles conversavam sobre arte, vida, trabalho, riam das coincidências da vida e trocavam memórias de anos atrás — o ônibus, o anel, a pergunta sobre acanto.

— Ainda tem aquele anel? — ele perguntou, brincando.

— Tenho! Tá em casa. E agora eu sei que não são folhas de acanto — ela disse sorrindo — Mas gosto de imaginar que sejam.

Os dois pararam diante de uma instalação feita de espelhos e molduras vazias. Ele olhou para ela, ela sentiu o olhar e virou o rosto de leve. Por um instante, Miguel pensou em encostar sua mão na dela. Quase.

Ela respirou fundo e disse, baixinho:

— Sabe... eu fiquei pensando naquele dia no ônibus por muito tempo.

— Eu também. Devia ter pedido seu telefone.

— Mas agora você pode.

A moça tirou o celular da bolsa, estendendo para o rapaz que logo digitou o número. Assim que pegou o celular, Bia enviou uma mensagem de confirmação.

Por fim, caminharam até a porta de saída. Lá fora, o vento trazia o cheiro da chuva que talvez não viesse. Bia se virou para ele com um sorriso quase tímido.

— Foi muito bom te rever, Miguel. De verdade.

— Foi mais do que bom, Bia. Espero que a gente não se perca de novo.

Eles se olharam por um instante a mais. Nenhum dos dois se aproximou. Mas ambos queriam. E sabiam disso.

Ela acenou levemente e se afastou, cruzando a praça. Miguel ficou ali, com o telefone no bolso e o coração pulsando mais rápido do que na reunião mais intensa do dia.

Naldo Costa

Comentários

Deia sousa disse…
Aaaa q fofo...quero mais...eles voltaram a se encontrar?

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